style="width: 100%;" data-filename="retriever">
Júlio Cesar, antigo cônsul romano, ao voltar de uma campanha vitoriosa em que conquistara a Gália, situada ao norte de onde hoje fica a França, foi chamado pelos senadores romanos a retornar à cidade. Todavia, ansioso por perseguir Pompeu, seu antigo aliado, Júlio Cesar cruzou o Rio Rubicão, que marcava o limite norte da urbe romana, acompanhado de suas legiões armadas, infringindo frontalmente a lei que proibia que um general marchasse armado sobre o solo romano.
Ao fazê-lo, Júlio Cesar insultou instituições e tradições romanas, decretou o fim da democracia republicana e precipitou uma guerra civil que levaria Roma ao caos. Acabou assassinado cinco anos depois, atacado por mais de sessenta homens, dentre os quais, seu próprio filho, Brutus. Hoje, "atravessar o Rubicão" é expressão que possui duas conotações: designa extrapolar os limites, quebrar regras, ou tomar decisões drásticas e irreversíveis sem conhecimento preciso quanto às consequências futuras.
Mas não é sobre Júlio Cesar, sobre Roma, ou sobre o Rio Rubicão que pretendo falar. Quero falar sobre a política brasileira e, sobretudo, sobre a democracia, ou melhor, sobre o enorme risco que ela corre. A democracia é cara e, como se observa no exemplo romano, não é irreversível. Pode ser corrompida, asfixiada e, quando isso acontece, acaba por redundar em caos.
A França também nos serve de exemplo: saiu embriagada de uma revolução libertária para, logo depois, cair no colo de Napoleão Bonaparte.
Aqui no Brasil, também estamos atravessando nosso Rubicão, a passos largos, todos os dias, por diferentes autoridades, de diferentes esferas de poder e de governo, em atos que aos poucos vão deteriorando instituições democráticas que levaram anos para se consolidar. E o pior, estamos consentindo com isso.
Por aqui, reitores já não são mais eleitos pela comunidade acadêmica, como se costumou fazer desde a proclamação da Constituição Federal. Igualmente, o Procurador Geral da República, chefe do Ministério Público, encarregado justamente de responsabilizar o Governo Federal em suas instâncias maiores, já não é mais o eleito por seus próprios pares, como se costumou fazer desde muito. Para chefiar a mais importante embaixada brasileira no exterior, um filho do presidente vem sendo cogitado e tem grandes chances de ser o escolhido, à revelia, inclusive, de qualquer critério técnico, intelectual ou mesmo moral.
Ademais: prefeitos assumem a possibilidade de determinar quais livros podem ou não ser vendidos ao público. A política externa passou a se basear em ofensas pessoais a esposas de líderes estrangeiros. Órgãos técnicos e científicos do próprio governo, como Ibama, INPE e IBGE, são solenemente contrariados por autoridades, tudo com a complacência de uma população anestesiada por um turbilhão de informações que nem sequer sabem se são falsas ou verdadeiras, além de um Judiciário mais interessado em garantir a incorporação de mais um benefício à sua remuneração do que garantir a Lei e as instituições.
Estamos atravessando o Rubicão, senhoras e senhores, e lhes digo: depois disso, não sabemos como voltar atrás.